23 de novembro de 2010

Vida de lã


           Minha vida é curta, pois tem apenas três segundos...
            O que passou. O que eu estou. E o que virá. O que passa anda atrelado em minha lembrança, que diz: Sobrevivi!
            O que estou, é o que me torna vivo e em eterna dependência,
            E o que virá, é o que deixa a mais incoerente de todas as saudades. Saudade precoce daquilo que nem se viveu ainda. A saudade do que se vai um dia, para sempre.
            O segundo - passado, eu posso construir, como um novelo de lã que deixo pelo caminho. Eu determino como eu quero seu trajeto, mudando da minha maneira, porém, com apenas uma chance para essa mudança; não por inexistir possibilidades - ao contrário, há várias - mas por ser um momento único, um único segundo. O segundo-futuro, este sim, eu não posso modificar, pois é dele que eu recebo a linha do novelo, bruta, como me é dada. O passado é certo(menos a compreensão), o presente é tudo, e o futuro é indeterminado. O depois é o único segredo deste jogo perfeito, e o antes é o verdadeiro sonho que nos guia em frente.
            Quando esta linha chega em minhas mãos, eu não a posso modificar de imediato, pois corre o risco de ela ser cortada – desastradamente - por mim.  Coloco então minhas mãos no passado, e então sim, transformo-a da maneira que quero que seja e fique em minha mente, como lembrança.
            Não se pode arriscar mudar o presente, pois é muito perigoso. Nem o futuro, pois é incerto e misterioso, não se sabe quando a linha lhe será cortada, nem que te fornece.
            Que contra-senso tudo isto; ou o reverso. O que existe nas minhas costas também olha diretamente minha face.


            Belo e aflitivo novelo de vida bruta. És imenso de tal maneira, que nem sei o que faço contigo às vezes. Talvez, não haja fornecedor. Será criador e próprio novelo? Pareces estar sempre entre minhas mãos entrelaçado; rodeando estes minutos que sequer vejo como reais. Ciclo, que não sei onde começa nem onde acaba. Como o horizonte, em que suponho outras existências.
            Três segundos, apenas. Sim, daquilo que encontrei criado, uso apenas isto para viver, três trêmulos segundos.
            Já que há escolhas, prefiro acreditar que este tudo existe. Independente da forma como tudo vem a mim.


            Faço então com minhas mãos desenhos nesta linha. Uns pequenos e outros grandes - lembrando que quando a ponta inicial do novelo lhe é dada, você não sabe o que - nem como - desenhar nela. Entretanto com o passar do tempo você vai aprendendo e aperfeiçoando, por si só, ou observando outros desenharem, colorirem e enfeitarem seus novelos. É triste para alguns saberem disso, mas: Parte de nós vive o passado sempre.
            Sei que há uns que cansam a todo o instante de fazerem isso. Outros, julgam divertido e prazeroso. E há os que simplesmente decidem parar. Em meus segundos-passados, tudo que foi feito, foi feito da cor que quis, da forma quis, com as falhas e adereços que quis colocar.  A ultima e eterna fração do presente, portanto, não é começo de uma lembrança, é fim. Pois esta curta vida de três segundos, ocorre inversamente do que uns pensam. E sempre que quero recordar o que fiz há muitos segundos atrás, paro - sem que o fornecedor perceba - e volto a linha do novelo como uma fita, até a parte que quero rever. Porém em algumas partes não há como ver mais o que fiz, ou por não ter feito direito, ou porque fiz sem dar importância ou porque fiz propositalmente de maneira pra não poder presentemente recordar.
            Há um outro importante detalhe, não posso pôr os meus pés no segundo-futuro, meus pés estão sempre no segundo-presente, e minhas mãos ininterruptamente trabalhando o passado. Não se pode fugir a ordem natural das coisas, portanto se você parar de construir o passado, o tempo pára também, não lhe é dado mais novelo bruto. A vida são três segundos que não param de acontecer... tão rápido e brusco, que é natural que a enxerguemos de uma maneira diferente. Pasmem, mas nosso pensamento é lento – ou sonhador demais - para perceber a vida desta forma.
            E cuidado! Pois às vezes - como já aconteceu comigo - lhe dá uma súbita vontade de puxar a linha, pra ver logo quem é o misterioso fornecedor, mas os que puxam a linha, na verdade são puxados por ela, porque ao contrário do que parece, a linha não vem, ela sempre vai. Você tem sempre que está em movimento com o tempo. Não é uma força inerte nem  continua, e sim algo que te puxa suavemente, e você têm sempre que estar atento pra não colocar força demais, nem de menos, pois pode ser tragado pelos segundos que te cercam.




[Robson W.]

Nenhum comentário:

Postar um comentário